Têm momentos na vida em que o sofrimento é tanto, que a gente chega a pensar: “Deus me abandonou! Não está mais comigo!” E de repente a gente descobre que Ele nunca tinha ido embora, mas que a gente mesma estava com os olhos vendados, sem enxergar a presença dele. Aí, tudo muda e fica transfigurado. É a Transfiguração!
O novo vai abrindo caminho, a transformação vai acontecendo. As tensões entre o Novo e o Antigo foram crescendo. No fim, Jesus fez um levantamento e percebeu que ninguém tinha entendido a sua proposta. O povo o imaginava como João Batista, Elias ou algum dos antigos profetas. Os discípulos o aceitavam como Messias, mas como Messias glorioso, bem de acordo com a propaganda da religião oficial do Templo. Jesus tentou explicar aos discípulos que o caminho previsto pelos profetas era o caminho do sofrimento, como consequência do compromisso assumido com os excluídos, e que o discípulo só poderia ser discípulo se carregasse a cruz atrás dele. Mas não teve muito êxito. É neste contexto de crise que acontece a Transfiguração.
Para entendermos bem as Liturgias de hoje vejamos que na primeira leitura Abrão e Sara já de idade avançadas, estéril e nômade, Deus faz uma aliança e lhe promete descendência e terra – dois elementos importantes para quem necessita de mão de obra e de onde tirar sustento para garantir a sobrevivência. Abrão crê no Senhor, Sara vê sua fé desafiada diante desta promessa em sua realidade pela lógica humana. O símbolo utilizado indica que os contraentes aceitam ser cortados ao meio se não cumprirem a palavra. Deus ao contrário do ser humano sempre é fiel às suas alianças acentuando a importância da confiança em Deus.
Na segunda leitura, percebe-se certo conflito na comunidade de Filipos, o qual chegou a ponto de deixar o autor em lagrimas. Trata-se dos que se comportam como inimigos da cruz de cristo. O próprio Paulo se propõe como exemplo a ser imitado e anima os “amigos de Cristo” a continuarem firmes nessa amizade mediante a experiência do Ressuscitado a qual leva à transformação da vida.
No Evangelho Jesus revela, mediante a transfiguração, sua futura glória sem passar pela cruz. Era exatamente essa a proposta de Pedro, que desejava seguir o caminho sem a cruz, construindo tendas no lugar onde se realizava as missões. A transfiguração é como que uma antecipação do resultado da ressurreição de Cristo; ela nos ensina que é necessário ouvir a voz do Filho de Deus para transfigurar nossa vida e, consequentemente, transformar a realidade em que vivemos.
Várias vezes, Jesus já tinha entrado em conflito com as autoridades. Ele sabia que não iriam deixá-lo fazer o que estava fazendo. Mais cedo ou mais tarde, iriam prendê-lo. Pois, dentro daquela sociedade, o anúncio do Reino, do jeito que era feito por Jesus, não seria tolerado. Ou ele voltava atrás, ou seria morto! Não havia outra alternativa. Jesus não voltaria atrás. Por isso, a cruz aparece no horizonte, já não como uma possibilidade, mas sim como uma certeza. Junto com a cruz aparece a tentação de seguir pelo caminho do Messias Glorioso e não pelo caminho do Servo Crucificado. Nesta hora difícil, Jesus sobe a montanha para rezar, e leva consigo Pedro, Tiago e João.
Enquanto reza, Jesus muda de aspecto e diante dos discípulos aparece glorioso, do jeito que eles o imaginavam. E junto com Jesus na mesma glória aparecem Moisés e Elias, os dois maiores do Antigo Testamento, que representavam a Lei e os Profetas. Eles conversam com Jesus sobre “o êxodo a ser completado em Jerusalém”.
Assim, diante dos discípulos, a Lei e os Profetas confirmam que Jesus é realmente o Messias prometido no Antigo Testamento e esperado pelo povo. Mas confirmam também que o caminho para a glória passa pela travessia dolorosa do “Êxodo”. O êxodo de Jesus é a sua paixão, morte e ressurreição. Pelo seu êxodo, ele vai quebrar o domínio da propaganda do governo e da religião oficial, que mantinha todos presos dentro da visão do Messias nacionalista. Jesus vai libertar o povo da Cruz. Parece que a fala da cruz não agrada. Eles querem é segurar o momento da glória no alto do Monte e se oferecem para construir três tendas conforme o costume.
Eles estavam dormindo e só acordaram no fim. Ainda puderam ver um restinho da glória de Jesus rodeado de uma luz celestial, mas não escutaram a conversa sobre o êxodo. Como acontece conosco tantas vezes, eles escutaram só aquilo que lhes interessava. O resto escapou da atenção deles! E agora, acordando, falam bobagem, ficam com medo e não querem mais descer. Toda vez que se fala da cruz, tanto no Monte da Transfiguração como no Monte das Oliveiras, eles dormem. Gostam mais da glória do que da cruz. Parece que a fala da cruz não agrada.
A voz do Pai sai da nuvem e diz: “Este é o Meu Filho querido. Escutem o que Ele diz”. Com esta mesma frase o profeta Isaías tinha anunciado o Messias-Servo (Is 42,1). Depois de Moisés e Elias, agora é o próprio Pai que apresenta Jesus como Messias que chega a glória através da cruz. No fim da visão, Moisés e Elias desaparecem e só fica Jesus. Isto significa que, dali para frente, quem interpreta a Escritura e a Vontade de Deus para o povo seria Jesus, só ele! Ele é a Palavra de Deus para os discípulos: ‘Ouçam-no! Escuta o que ele diz.’
Meus queridos irmãos e irmãs A Transfiguração é narrada em três Evangelhos: Mateus, Marcos e Lucas. Sinal de que este episódio tinha uma mensagem importante para as primeiras comunidades. Ela foi uma ajuda para superar a crise que a cruz e o sofrimento provocaram nos discípulos e discípulas. A Transfiguração continua sendo ajuda para superar a crise que o sofrimento e a cruz provocam hoje. Os três discípulos dorminhocos são o espelho de todos nós. A voz do Pai diz a eles e a nós: “Este é o meu filho, o eleito, escutai o que ele vos diz!”
No Evangelho de Lucas, há uma semelhança muito grande entre a cena da Transfiguração e a cena da agonia de Jesus no Horto das Oliveiras. Você pode conferir e vai perceber o seguinte: nos dois episódios, Jesus sobe a montanha para rezar e leva consigo os mesmos discípulos, Pedro, Tiago e João. Nas duas ocasiões, Jesus muda de aspecto e se transfigura diante deles, seja glorioso, seja suando gotas de sangue. Nas duas vezes aparecem figuras celestes para confortá-lo, seja Moisés e Elias, seja o Anjo do Céu.
E tanto na Transfiguração como na Agonia, os discípulos dormem, se mostram alheios ao fato e parecem não entender nada. No final dos dois episódios, Jesus se reúne de novo com seus discípulos. Sem dúvida, Lucas teve alguma intenção em acentuar a semelhança entre estes dois episódios. Qual seria? É meditando e rezando que, aos poucos, conseguiremos chegar por trás das palavras e perceber a intenção do seu autor. E o Espírito de Jesus nos guiará. Amém!
Direto da Santa Missa em Seu Lar
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